terça-feira, 26 de agosto de 2014

Pós-humano

Bom dia gente,
no post passado eu havia dito que tentaria relacionar a decadência social vista naquele trecho do livro do Hesse com o texto "Pós-humano por que?", mas, devo admitir, achei que o texto falava de uma coisa, e não tinha nenhuma relação com o que eu pensava.
Pensei em algo pós-moderno, algo relacionado com os conceitos do Baumann, da liquidez e instabilidade em todas as esferas da vida cotidiana...
O texto não trata disso, então vou falar um pouco sobre o que ele trata e principalmente o que ele me levou a pensar, e não foram poucas coisas.

O texto começa com um contexto do momento atual: os avanços tecnológicos e científicos que ocorreram nas duas últimas décadas duplicaram o conhecimento que a humanidade tinha até então.

Ao mesmo tempo, mais máquinas, e mais inteligentes, apesar de ser uma inteligência robótica, programada, fazem parte do nosso cotidiano.
Não um androide estranho e assustador, mas computadores, processadores, microchips, cada vez menores e mais eficazes, e específicos.
A nanotecnologia é um exemplo, talvez o melhor, de manipulações tecnológicas em escalas absurdamente pequenas podem "se confundir" com um organismo vivo, seja ele humano ou não, através dos avanços na biologia molecular.

Na década de 80 surge o termo "cyberpunk":
"O movimento ciberpunk abraça as tecnologias, mas de maneira rebelde, a margem da lei, contra o Estado centralizador e as grandes estruturas econômico-financeiras, sendo favorável, portanto, 'a um uso subcultural mais descentralizado da ciência e da tecnologia a serviço dos indivíduos'." (Pg 129, Revista USP, São Paulo, n.74)

O pós-humano seria como o ciborgue, algo híbrido, entre homem e máquina.

No texto dizem:
"Reivindicar a existência de corpos pós-humanos significa deslocar, tirar do lugar, as velhas identidades e orientações hierárquicas, patriarcais, centradas em valores masculinos (...) com seu questionamento das dicotomias ocidentais entre mente/corpo, organismo/máquina, natureza/cultura, antinomias estas que também davam suporte ao patriarcado, a ideia do ciborgue penetrou intensamente na cultura, colocando em questão não apenas a relação do humano com a tecnologia, mas a própria ontologia do sujeito humano"

Entretanto a autora do texto preferem chamar de "biocibernético" porque não carrega referências a ficção científica estadunidense e mostra melhor a relação entre o biológico (organismo, corpo) e o cibernético (novas tecnologias).

E um trecho me incomodou muuuuuuuuuuuito:

"Assim, valendo-se da nova alquimia tecncientífica, o 'homem pós-biológico' teria condições de superar as limitações importas pela sua organicidade, tanto em nível espacial quanto temporal"(Lucia Santaella apud Sibilia, 2002)

Isso parece mais um jeito de ignorar as limitações humanas, que estamos sujeitos a ciclos naturais, assim como as tecnologias que podemos desenvolver ou desenvolvemos, por mais sofisticada que seja a manipulação e forma de controle.
Parece que o desenvolvimento cada vez mais complexo das ciências e teclogia tem fortalecido a ideia de uma independência do homem da natureza em geral, e nós somos também natureza! Parece que fortalece essa dissociação, e assim perpetua a dualidade, e não a ameniza. Mas não a dualidade mente x corpo, mas limitações naturais x possibilidades tecnológicas, ignorando limitações, e isso se reflete em outros campos, como nas discussões de desenvolvimento sustentável, em que os pensadores ortodoxos colocam a solução de tudo no próprio desenvolvimento econômico e nas novas tecnologias.
É como se a sociedade a qual pertencemos (ocidental e capitalista) tivesse trocado o deus cristão pelo desenvolvimento científico-tecnológico: dedique-se a sua glória e será salvo.
Se esquecem, porém, que a tecnologia não se desenvolve para servir ao bem da humanidade, que as inovações surgem nas guerras, e são adaptadas para produtos que serão consumidos e produzidos de forma não sustentável.
A ideia de que esse desenvolvimento pode alterar o paradigma da nossa sociedade e quebrar ciclos de opressão parece bem bonita e sedutora, mas não convincente. 
Como algo que nasce para propósitos de opressão e de sustentar a ordem vigente, é desenvolvido e se propaga através desta ordem, pode carregar em si sementes de mudança? Não consigo acreditar nesse tipo de revolução, seria no máximo uma reforma, e reformas não alteram muita coisa.
No fim do texto a autora também expõe a opinião dela sobre essa visão:
"o pós-humano significaria a superação das fragilidades e vulnerabilidades de nossa condição humana, sobretudo do nosso destino para o envelhecimento e a morte. Tal superação seria atingida pela substituição de nossa natureza biológica por uma outra natureza artificialmente produzida que não sofreria as limitações e constrangimentos de nosso ser orgânico, hoje obsoleto. A meu ver, além de simplista, reducionista, essa compreensão é ilusionista."


Nenhum comentário:

Postar um comentário